terça-feira, 20 de novembro de 2012

NOSSO DEUS NÃO DANÇA?


Igreja dos Capuchinhos (São Francisco de Assis) - Belém/PA

Ao ir à igreja dos capuchinhos “participar de uma missa” só que dessa vez de forma “observação participante”, local onde fiz minha primeira comunhão, crisma e onde ocorreu todo o meu engajamento e catequização cristã, fiquei chocado com a capacidade do frade que conduziu a celebração mas não os corações dos presentes tornava o mistério cristão na celebração mais horrenda do mundo. Fora o rito romano imposto, que não é o problema mais grave desde que o participante compreenda o seu sentido litúrgico de cada parte ou tenha sido muito bem “catequizado” para engolir isso tudo sem sentido algum. Pude perceber algumas mudanças… para pior. Se a missa é a celebração do mistério cristão, se é a ação de graças de nossas vidas, por que temos que estar focados em um folheto que não nos permite nem se quer de olhar para quem estar ao nosso lado? Todos ali reunidos, mas não unidos, desconhecidos que por alguns minutos comungam um mesmo rito, mas não a mesma fé, que mecanicamente levantam 5 vezes, sentam 4 e ajoelham-se 01 sem ao menos saberem porque o fazem. Todos atentos a uma homilia escatológica que mais ressaltava a denúncia de “falsos profetas e suas idéias de fim do mundo”, só para citar as referências do frade: os maias e as testemunhas de Jeová, pode? Banhado por uma repetição de que existe o fim de um mundo e não do mundo…aff! (referências: queda do império romano e destruição de Jerusalém, as torres gêmeas e a violência em São Paulo, puts!) e o anúncio do novo ano litúrgico que está para começar…será que todas aquelas pessoas reunidas no rito estariam interessadas no que ele estava falando? Por que o sensacionalismo por ele feito a mídia faz com muito mais propriedade e a torna muito mais interessante. Será que só eu havia entendido ou ao menos gravado todas aquelas palavras “no coração” porque me fizeram sentir absolutamente nada… não é esse o fundo do mistério, fazer sentir? Ou eu deveria ficar com mais uma preciosidade do frade “você que não comungou, comungue agora com Cristo que está em sua consciência…” Antes eu ouviria “comungue agora com Cristo que está em seu coração”… mudança de eixo significa mudança de pensamento, de sentimento? Desmotivado pelos desconhecidos que timidamente levantavam os braços, um aqui outro ali, para louvar ao Senhor pensei: onde ficou a alegria de louvar a Deus de todo o coração, não de consciência, de celebrar o mistérios, de se irmanar na mesma fé? Como tenho acompanhado alguns de meus amigos em projetos de pesquisa e extensão na UFOPA sobre a temática de religiões de matrizes africanas tenho percebido o quanto a dança faz toda diferença na religação com o divino, concluí: missa para que se nosso Deus não dança? Para quê música chata, quero dizer sacra, banquete, vinho, pão se não dançamos e nem nosso Deus dança? O que é uma festa sem a dança? É um ato triste, horrendo, sem graça, ou seja, é uma missa celebrada na igreja dos capuchinhos em pleno sábado às 19h30.
 
“Povos todos, batei palmas, aclamai a Deus com gritos alegres.” Sl 47,1
 
“Meu coração está firme, ó Deus, meu coração está firme; quero tocar e cantar para ti!.” Sl 57,8

 “Aleluia! Cantai a Deus um cântico novo, seu louvor na assembléia dos fieis! Alegre-se Israel com aquele que o fez, os filhos de Sião festejem o seu rei! Louvem seu nome com danças, toquem para ele a cítara e tambor!” (Sl 149, 1-3)

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

PROJETO TERRA DE NEGRO - PRETA TERRA



Esse projeto nasceu da observação desapercebida da Terra Preta no quilombo de Bom Jardim durante as muitas vezes que por lá estive realizando outros tipos de projetos voltados à cultura, segurança alimentar, saúde  e à regularização fundiária.  Às vezes que lá estive, no platô de Terra Preta, a única observação que tinha era de que a terra era usada para plantio e de que haviam muitos "cacos" pelo chão.

Ao ingressar no 3º semestre, no Programa de Antropologia e Arqueologia (PAA), da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) deparei-me com uma disciplina que soltou-me aos olhos: Terra Preta de Índio, fiquei curioso e me matriculei, pois até em então em meu curto raciocínio tudo que fosse voltado ao preto, preta, negro seria de meu interesse em vista de que eu trabalhava com as comunidades quilombolas de Santarém e de que era importante endenter tudo que estivesse ligado a essa temática, ou seria à cor? 

Enfim matriculei-me e lá descobri um universo jamais pensado. Assim fui construindo a teia que se formava entre a Terra Preta de Índio e os Território Quilombolas, foi então que após uma visita orientada pela professora Lilian Rebellato à Terra Preta do quilombo Bom Jardim nos permitiu um olhar mais técnico sobre tudo o que nos cercava, foi daí que nasceu o desejo de compreender a relação do uso da Terra Preta com  identidade quilombola, desse desejo nasceu esse projeto, o primeiro de muitos que a vida me permitirá  construir com a ajuda de meus orientadores e amigos de graduação.



Título: Terra de Negro – Preta Terra: o uso da Terra Preta (TP) como instrumento de fortalecimento da identidade quilombola no município de Santarém. 

Objetivo Geral: Analisar a relação do uso de Terra Preta com o fortalecimento da identidade em territórios étnicos quilombolas no município de Santarém.

Objetivos específicos:
·         Realizar o mapeamento dos territórios de TP nos quilombos de Bom Jardim, Murumuru, Murumututuba e Tiningú;
·         Realizar a identificação idiossincrática dos solos de TP;
·         Identificar conflitos agrários pelo uso da TP;
·         Identificar marcadores de relação entre o uso da TP com o fortalecimento da identidade étnica quilombola.
Justificativa:
No município de Santarém são 10 as comunidades de remanescente de quilombos, a seguir: Arapemã, Bom Jardim, Murumuru, Murumurutuba, Nova Vista do Ituqui, Pérola do Maicá, São José do Ituqui, São Raimundo do Ituqui, Saracura e Tiningú. Cinco desses quilombos estão localizados na área de planalto (Murumuru, Murumurutuba, Tiningú, Pérola do Maicá e Bom Jardim) e cinco na área de várzea (Arapemã, Saracura, Nova Vista do Ituqui, São Raimundo do Ituqui e São José do Ituqui).
 Desses quilombos Bom Jardim, Murumuru, Murumurutuba e Tiningú são os territórios que possuem Terra Preta que ficam localizadas na parte alta dos quilombos, já que estes estão localizados na parte baixa à margem do lago Maicá. Atrás da área de habitação estão os montes onde estão situadas a TP que é utilizada como área de produção de agricultura.
Segundo Sombroek (2009) “as Terras Pretas Antropogênicas ocorrem frequentemente na região Amazônica, especialmente na brasileira. São localmente conhecidas como Terra Preta, Terra Preta-de-Índio ou Terra Preta Arqueológica/Antrópica, e são o efeito remanescente de ocupação intensiva da terra por grupos indígenas Pré Colombianos.” Afirma ainda que “os solos de TP muito material arqueológico. São preto ou bruno escuro até a profundidade de 50 cm em média”.
Por conta da fertilidade do solo de TP as comunidades tradicionais, como as quilombolas, e até mesmo a de outros povos da floresta que estão estabelecidos sobre a TP, geralmente a utilizam para a agricultura, principalmente a de subsistência, isso se dá por conta da facilidade de identificação da TP, “mesmo sob densa cobertura florestal, devido os diferentes grupos e espécies arbóreas que ocorrem nesses locais (SOMBROEK, 2009)
Nas comunidades de remanescentes de quilombo de Bom Jardim, Murumuru, Murumurutuba e Tiningú os principais produtos cultivados na área de TP são milho, mandioca, mamão, holerícolas, tomate, pimentão entre outros cultivos. Geralmente a técnica utilizada no roçado é a da coivara, corta e queimar, para depois plantar, no entanto há uma questão que precisa ser analisada que é de como estas comunidades quilombolas estão contribuindo para que a TP continue fértil para o próximo cultivo na mesma área.
Definir os chamados povos tradicionais na Amazônia é tão complexo e discutível quanto à própria definição de “povos tradicionais”, mas aqui por enquanto, a discussão será detida ao conceito que Manuela da Cunha (2007) os define como grupos que conquistaram ou estão lutando para conquistar (prática e simbolicamente) uma identidade pública conservacionista que inclui algumas das seguintes características: uso de técnicas ambientais de baixo impacto, formas equitativas de organização social, presença de instituições com legitimidade para fazer cumprir suas leis, liderança local e, por fim, traços culturais que são seletivamente reafirmados e reelaborados.
Dessa forma a manutenção da biodiversidade é um marcador identitário dos povos das florestas ou povos tradicionais, no caso das comunidades de remanescentes de quilombo, um marcador étnico que precisa ser observado e comprovado nessa pesquisa. “A identidade étnica surge como uma  estratégia política de ação coletiva em defesa do território que ocupam e na garantia da reprodução de seu modo de vida característico” (O’DWYER, 2002). “O território é ainda concebido como um bem recebido do passado e que deve ser remetido ao futuro para as novas gerações, essa compreensão questiona o sentido de propriedade quando dá ao território o sentido de transitoriedade das gerações tornando estas guardiãs de um processo de acumulação de saberes e práticas tradicionais” (CASTRO, 1997).
Outro ponto a ser observado é se existem conflitos, principalmente agrários e fundiários por conta do uso da TP. Nesse aspecto o processo de regularização fundiária no Brasil se mostra um grande problema desde o período colonial. As formas de ocupação do território brasileiro sempre se mostraram como alternativas devastadoras sem considerar os sujeitos  que aqui já habitavam. Ao longo de toda sua história a luta pelo território sempre revelou grandes interesses econômicos seja no setor mineral, drogas do sertão, café, cana-de-açúcar, madeireiro e pecuária. Dessa forma, identificar esses conflitos que podem também ter sido gerados por conta do uso da TP será interessante pra entender  a relação da comunidade com a seguridade do território de TP.
 É nesse sentido que esse projeto se propõe, analisar  a relação do uso histórico da TP pelos remanescentes de quilombos no município de Santarém com o fortalecimento de sua identidade étnica e como essa relação pode ser utilizada como instrumento para o processo de regularização fundiária desses territórios.
Metodologia
Resultados esperados:
Historicamente as comunidades de remanescentes de quilombo de Santarém sempre sofreram com um processo de invisibilidade social existente por conta do processo de preconceito imposto pela sociedade em relação aos povos que foram escravizados no período colonial do Brasil da qual cuja herança de preconceito e marginalização foi transferida aos seus descendentes, como é o caso das comunidades quilombolas.
O processo de regularização fundiária pelo qual essas comunidades estão passando é um forma de referendar sua posse sobre seu território e de auto afirmar sua identidade étnica. Dessa forma o projeto pretende apresentar como resultado mais instrumentos que contribuam com esta visibilidade, desconstrução do preconceito, auto afirmação identitária e posse do território através de um mapeamento dos territórios de TP nos quilombos de Bom Jardim, Murumuru, Murumututuba e Tiningú associados à práticas de manejo em agricultura em TP identificadas nesses territórios. O mapeamento também resultará na identificação de conflitos agrários ou fundiários que poderão ter sido causados pelo uso da TP os quais poderão ser encaminhados aos Órgãos competentes de regularização fundiária para a tomada das devidas providências.
Identificado  e analisados os marcadores de fortalecimento da identidade étnica quilombola por conta do manejo da TP será possível oferecer subsídios para que se construa, juntamente com a comunidade, e desde que seja demandada por ela, um projeto de fortalecimento da identidade étnica.
O projeto ainda trará como resultados um maior conhecimento técnico sobre o uso da Terra Preta assim como a construção sistematizada e publicada do conhecimento idiossincrático dos quilombolas.

Bibliografia:
ALMEIDA, A. Wagner Berno de. Uma campanha de desterritorialização – Direitos territoriais e étnicos: a bola da vez dos estrategistas dos agronegócios. Proposta. Rio de Janeiro, ano 31, n. 114, p. 33 – 36, out – dez. 2007.

CASTRO, Edna; FLORENCE, Pinton (Org.). Faces do Trópico Úmido – Conceitos e questões sobre o Desenvolvimento e Meio Ambiente.  Território, Biodiversidade e Saberes de Populações Tradicionais. Editora CEJUP; UFPA/NAEA, 1997.

COSTA, M. Lima da. et al. O Ambiente Amazônico. Paisagens Amazônicas sob a ocupação do Homem Pré-Histórico: Uma visão Geológica. / Wenceslau Geraldes Teixeira…[et al.] Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2009. 15 p.

CUNHA, Manuela. Cultura com aspas e outros ensaios. Relações e dissensões entre saberes tradicionais e saber científico. Revista da USP, n 75, set-nov. 2007.

FUNES, E. Área das Cabeceiras – Terras de Remanescentes: Silêncio, Matá, Castanhanduba, Cuecé, Apuí e São José, São Paulo, agosto, 1999.


______. Bom Jardim, Murumurutuba, Murumuru, Tiningú, Ituqui, Saracura, Arapemã. Terra de afroamazônias, agosto, de 2005

KERN, Dirse Clara. et al. As Terras Pretas de Índio na Amazônia: Evolução do Conhecimento em Terra Preta de Índio. / Wenceslau Geraldes Teixeira…[et al.] Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2009. 72 p.

O’DWYER, Eliane Cantarino. Remanescentes de quilombos na fronteira Amazônica: a etnicidade como instrumento de luta pela terra. Rede Amazonia: Diversidade sociocultural e políticas ambientais – Ano I, n. 1 (2002) – Rio de janeiro: [S.n.], 2002.

POUTIGNAT, Philippe. Teorias da etnicidade. Seguido de grupos étnicos e suas fronteiras de Fredrik Barth/Philippe Poutignat, Jocelyne Streiff-Fenart. O Domínio da etnicidade: as questões-chave; tradução de Elcio Fernandes. – São Paulo: Fundação Editora da ENESP, 1998. – (Biblioteca básica).

SOMBROEK, W. Terra Preta Nova. As terras pretas de índio da Amazônia: sua caracterização e uso deste conhecimento na criação de novas áreas / Wenceslau Geraldes Teixeira…[et al.] Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2009. 420 p.

WOODS, William. Os solos e as Ciências Humanas: Interpretação do Passado. / Wenceslau Geraldes Teixeira…[et al.] Manaus: Embrapa Amazônia Ocidental, 2009. 62 p.

terça-feira, 22 de maio de 2012

UM OLHAR SOBRE O MERCADÃO 2000 - SANTARÉM / PA


Universidade Federal do Oeste do Pará - UFOPA
Instituto de Ciências da Sociedade - ICS
Programa de Antropologia e Arqueologia - PAA

 Aldo Luciano Corrêa de Lima

Inclusão, exclusão, espaço e poder no complexo do Mercadão 2000 em Santarém – Pará.
 

As feiras e demais espaços de comercialização sempre se constituíram de relações complexas de poder social decorrentes do poder econômico que cada indivíduo exerce sobre outro nessa relação de comércio. Nela é notória a distinção de papéis dos indivíduos que a constitui em função do aumento da produção, aperfeiçoamento e combinação de tarefas e de tecnologias, ou seja, sua especialização (ADAD, 2011).

 Em primeira visita in loco ao olhar desapercebido da maioria dos indivíduos que fazem parte desse complexo sistema de relações o que se pode perceber é uma ação coletiva mista e diversificada que engloba basicamente dois  sujeitos: vendedor e comprador. Relação essa que remonta às primeiras formas de comercialização nas áreas de florestas, denominadas de guildas,  até a constituição de feiras dentro dos muros dos castelos medievais.
              
            As relações de produção e comercialização que se estabelecem: domínio e sujeição são dois elementos importantes para sua compreensão. No entanto, ao se identificar cada sujeito e sua ação dentro do Complexo do Mercadão 2000 é possível constatar uma complexa rede  de relações que se estabelecem em diversos setores que constituem o Complexo e suas áreas adjacentes. Entender esse complexo sistema de relações é de fundamental importância para se entender através de uma análise etnográfica a relação de poder que cada indivíduo exerce sobre o espaço físico sob sua responsabilidade e sobre o outro seja ela de inclusão ou exclusão. 






 Trecho do trabalho da disciplina de Introdução à Etnografia realizado em maio de 2012.